Em 1988, depois de ajudar o São Paulo a levantar a taça de Campeão Paulista sobre o Corinthians, o atacante foi vendido para a Portuguesa. Em valores atualizados pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), a negociação hoje teria números bem modestos, cerca de R$ 83 mil. Mas, na época em que a inflação era um fantasma na vida dos brasileiros, os valores impressionaram.
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Ronaldo Francisco Lucato, conhecido como Lê, um diminutivo para "Alemãozinho", em referência à pele clara e aos cabelos loiros, havia chegado ao São Paulo dois anos antes com a difícil missão de substituir o ídolo tricolor Careca, vendido ao Napoli, da Itália.
Foi um pedido do treinador Pepe, com quem havia trabalhado na Inter de Limeira, e conquistado o Paulista de 1986. Ele conta que Juvenal Juvêncio (1934-2005), que era diretor de futebol do São Paulo na ocasião, não acreditava que o jovem, então com 24 anos, poderia substituir à altura um dos grandes ídolos da torcida tricolor. Mas ele conseguiu superar a desconfiança com o que fazia de melhor: gols.
"Como eu entrei e comecei a fazer gols, no bom sentido, a torcida esqueceu do Careca. Eu fui campeão paulista de 87 e marquei um gol na final contra o Corinthians nos 2x1 no primeiro jogo, e daí para frente acabou essa a cobrança em cima do [camisa] 9."
Pelo São Paulo, Lê fez 24 gols em dois anos, e foi artilheiro do time no Paulista, à frente de Müller. Até ser negociado com a Portuguesa de Desportos, em 1988, pelo valor astronômico para a época.
Saída do São Paulo
A saída de Lê do São Paulo também foi marcada por polêmicas. Como Juvenal Juvêncio não acreditava no potencial do atacante, fez um "contrato de gaveta", com a promessa de pagar o salário do Careca, caso ele conseguisse a vaga de titular no time, em que tinha jogadores como Müller e Silas.
"Só que o Juvenal Juvêncio nunca cumpriu. Quando acabou meu contrato de dois anos, eu falei: 'agora, quero reaver meu dinheiro'. Ele disse que não", relembra. Lê, então pediu para ser vendido. Foi quando apareceu a Portuguesa na jogada.
Apesar de não ter repetido na Lusa os números que havia conquistado pelo São Paulo (com apenas três gols em 25 jogos), Lê garante que não se arrependeu de ter feito a troca.
"Eu joguei na Portuguesa, ela me ofereceu mais e foi para lá que eu fui. Tenho que lutar por um clube que está pagando melhor. Sempre levei o lado profissional ao pé da letra. Então, eu saí do São Paulo não foi por briga, nem por mágoa, é que não chegou a um acordo. O São Paulo prometeu um negócio para mim e não cumpriu."
Carreira e título de "jogador moderno"
Natural de Limeira, no interior paulista, Lê iniciou a carreira na Internacional da sua cidade. Ele diz que jogava na escola e em ginásios da região, quando foi convidado para integrar a equipe sub-20 que a Inter estava montando. Mas se sobressaiu e, aos 16 anos, estava no time principal.
Na equipe, que tinha nomes experientes, como Kita, João Batista, no meio, e Tato, na direita, ele se encaixou como um "ponta falso" na esquerda.
"Todo mundo tinha o ponta direita e o esquerda, e eu fazia o quarto homem. Eu tinha força, tanto pela idade, para chegar com velocidade, tinha habilidade e ainda ajudava na marcação. A Inter ficou um pouco mais forte no meio campo e, ao mesmo tempo, rápida no contra-ataque", relembra.
Pelo time do interior paulista , foi campeão estadual 1986 em cima do Palmeiras. Lê relembra que entrou em campo em todos os jogos daquele campeonato, mesmo machucado, como aconteceu nas duas últimas partidas da decisão.
"No primeiro jogo contra o Palmeiras [em um domingo], eu tomei um pisão que varou a chuteira e cortou meu pé. Na hora nem senti, mas quando cheguei ao vestiário, vi que tinha muito sangue. Fiz tratamento para o segundo jogo, que era na quarta-feira. Teve corte, levei pontos fui para o jogo. No intervalo, seu Pepe me tirou. O pisão estava me incomodando muito."
Lê considera a conquista em cima do Palmeiras uma verdadeira "façanha", ainda mais que os dois jogos foram disputados na capital, no estádio do Morumbi.
"O primeiro jogo foi a chave para que a gente conseguisse essa façanha. Nós empatamos em 0 a 0 e ali foi o que deu a nossa coragem. O Palmeiras deu essa chance para nós, e foi aí que nós nos fechamos e falamos "é nosso". No jogo de volta, a Inter bateu o Verdão por 2 a 1.
Depois do Paulista, o treinador Pepe foi comandar o São Paulo e pediu para a contratação do atacante. Foi no clube do Morumbi que Lê fez o que considera "o gol mais importante" da carreira: o segundo do Tricolor na vitória por 2 a 1 contra o Corinthians, pela final do Paulistão de 1987.
"Foi o gol mais importante da minha carreira em termos de conquista. Fiz o gol de cabeça, com minha altura, 1,70, no Corinthians, e esse gol deu o título ao São Paulo. E ainda fui o artilheiro do São Paulo que tinha Müller. Isso fez com a diretoria não precisasse contratar mais um atacante, fui efetivado e morreu o assunto."
À época, foi classificado como atacante "moderno" pela revista Placar. Lê considera que foi o "primeiro camisa 9".
"Eu jogava sem a bola, procurava os espaços. Quando cheguei no São Paulo, os outros centroavantes eram altos, de área. Eu comecei a fazer um trabalho diferente. Modéstia à parte, eu fui o primeiro 9, depois teve Romário, Bebeto...Eu fazia essa leitura de jogo."
Além de Inter de Limeira, São Paulo e Portuguesa, Lê ainda defendeu o Internacional, de Porto Alegre, passou por Ituano, Santa Cruz (PE) e Atlético-MG antes de passar três temporadas no Otsuka, do Japão, e encerrar a carreira no Independente (SP), em 1998.
Vida após aposentadoria: "Hoje eu sou Ronaldo Francisco Lucato"
Aos 56 anos, Lê mora em Limeira, tem uma empresa de marketing esportivo, que presta assessoria a atletas, e diz que se preparou para ter uma vida "igual ou melhor do que quando eu jogava". "Hoje, eu sou o Ronaldo Francisco Lucato, não tem nada a ver com a questão do Lê. Eu tenho a minha empresa, tenho meus funcionários e tenho a minha vida. Vivo em prol disso".
Ele diz que, depois que encerrou a carreira, conseguiu se desvincular do futebol. Apesar de ter uma empresa que lida com atletas, afirma que seguiu os conselhos de Emerson Leão, ex-goleiro do Palmeiras e técnico da seleção brasileira, de não jogar nenhuma "pelada". "Você está lá brincando, por lazer, mas os caras querem cobrar você como um ex-jogador de futebol, como se fosse o Lê com 20 anos", diz.
Pela TV, ainda acompanha o futebol atual e lamenta que o jogador brasileiro tenha perdido a "malandragem, a malícia". "Aquela coisa de futebol arte. Não era esse negócio robótico. Eu cobrava, xingava. Uma malandragem que hoje não tem. Ninguém fala. Você não vê jogadores gesticulando, não vê nada".
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