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Oscar,um zagueiro para a eternidade

Vou dizer-lhes uma coisa, iguais.

Contratar um craque não é coisa para qualquer um. Perdi a conta de quantas vezes vi um dirigente de clube anunciar uma contratação e perdê-la, de quantas vezes vi um dirigente de clube dizer que contratou um gênio e a contratação virar mico. Para contratar um craque e ver o craque se consagrar é preciso inteligência, coragem, perspicácia, dedicação e sorte.

Ninguém poderia imaginar que o São Paulo FC, nos anos 40, trouxesse Sastre e Leônidas da Silva. Parecia inviável, eram sonhos impossíveis! Quem diria que Zizinho, o mestre Ziza, iria envergar a sacrossanta camisa das três mais lindas cores do mundo no fim dos anos 50, nos anos 70 as contratações de Gérson, o “canhotinha de ouro”, de Pedro Rocha, “el verdugo” e de Toninho “Guerreiro”, abalaram as estruturas do mundo da bola. Todos eles se eternizaram vestindo o manto sagrado tricolor, até hoje se pergunta, como é que se fêz para contratá-los e para que tivessem sucesso?

Inteligência, iguais, sobretudo, inteligência dos que conduziram as negociações e sorte, muita sorte. Quando o clube tem gente inteligente para representá-lo, quando o clube resolve destacar alguém diferenciado para negociar em seu nome não há como encontrar frustrações, a não ser que o negociador seja um azarado. Convencido pelo dirigente de que o plano para a sua carreira é perfeito com a transferência, ele (o jogador) resolve ir, e quando o faz acabou, fim de papo. Ninguém segura o jogador, nem seu empresário, nem sua família, nem seu advogado, é como água morro abaixo, é como fogo morro acima!

Nestes tempos modernos temos poucos diretores que representem os clubes com inteligência e dedicação. Quando aparece um dirigente assim os agentes enlouquecem, o craque não resiste a um bom papo... Contar-lhes-ei a história de um astro brilhante, rico e inteligente que foi convencido a voltar a jogar no Brasil por gente sagaz. O personagem a que me refiro nunca foi eclipsado, brilhou como um diamante, sua luz ofuscava, ele deslumbrou o Brasil!

Era uma vez... Em 1980/81 o São Paulo formou uma das maiores equipes que vi, dentro e fora do campo de jogo. Antonio Leme Nunes Galvão, aquele nobre e elegante presidente, constituiu na época uma diretoria de futebol perfeita, a diretoria tinha um diretor-geral e vários adjuntos, gente da melhor qualidade, pessoas ligadas ao marketing, pessoas comprometidas com o clube, amantes do “Mais Querido” até a medula. Todos jovens e com uma obstinação: ver o Tricolor brilhar. Galvão, o nobre, deu-lhes carta branca, era preciso transformar o São Paulo, reinventar o São Paulo, modernizar o São Paulo que andava opaco. Assim foi feito. Os jovens diretores saíram à caça de craques. O São Paulo trouxe Renato do Guarani, uma estrela rutilante, trouxe Aílton Lira do Santos, um virtuose, trouxe Paulo Cesar, a revelação do Botafogo de RP, chamado de “capeta”, trouxe Almir, um volante discreto e eficiente que rendia o máximo, trouxe Assis, do XV de Jaú, Assis, que iria, no futuro, entrar para a história do Fluminense ao lado de Washington, formando a famosa dupla denominada “Casal Vinte”; trouxe jogadores de todo o Brasil e maravilhou a torcida, ganhando o então importante Campeonato Paulista de 1.980 com sobras, marcando época, dando show.

O miolo da defesa, embora os diretores tivessem contratado Nei, do Botafogo de RP e Gassem, do futebol paranaense, era o setor que preocupava um pouco. O São Paulo terminou muito bem o 1º turno, estava na frente, mas faltava algo. Galvão, o classudo presidente, queria mais, estava disposto a reviver os anos 40, o que faltava? Faltava um líder na defesa para estabilizar de vez aquele esquadrão. José Oscar Bernardi nascera em Monte Sião, MG, aos 20/06/54. Oscar, como ficara conhecido no Futebol, era um zagueiro simplesmente excepcional. Revelado pela AA Ponte Preta de Campinas, Oscar era o objeto de desejo de todos os clubes do Brasil e do mundo, Oscar era um menino alto, loiro, um galã, não perdia divididas por baixo, por cima ninguém o vencia. Sabia sair jogando com elegância, era calmo, Oscar logo foi comparado a Mauro Ramos de Oliveira e convocado para a Seleção Brasileira, Campinas guardava, em Moisés Lucarelli, um craque para figurar nos compêndios da bola!

Oscar brilhou e rebrilhou intensamente enquanto defendeu a Ponte Preta, era gratificante ver aquele zagueiro-central saudável engolir os atacantes, Oscar punha prá correr os mais atrevidos dianteiros, com uma postura altiva poucas vezes vista em um zagueiro era ele a preciosidade de Campinas e da Ponte Preta até que o New York Cosmos, liderado por ninguém menos do que Pelé, o Rei, que à época lá estava, o contratou, pagando rios de dólares ao clube campineiro. Foi uma das maiores transações do futebol daquela década. Oscar cintilava nos EUA, dono de extraordinário prestígio, ganhava bem, mais do que bem, era um rei lá, mas o São Paulo, sob a filosofia revolucionária do elegante presidente Nunes Galvão resolveu que ele tinha que envergar a camisa 3 do Morumbi. A astuta e jovem diretoria adjunta saiu no encalço de Oscar, o zagueiro titular da seleção brasileira de 1978, o zagueiro impecável, consagrado, incensurável. Fernando Casal de Rey, Jaime Franco e mais dois ou três “almofadinhas”, como eram chamados os adjuntos pelos invejosos, foram para New York com uma missão: trazer, mercê de suas inteligências, “o belo”, como era chamado Oscar, para o Maior da América. As rádios noticiavam, as TVs repercutiam: O São Paulo quer Oscar! Palmeiras, Corinthians, Santos e outros, desdenhavam: era mentira!

Dias de conversações e de mexericos se sobrepuseram uns aos outros e afinal Oscar, seduzido pelo projeto inteligente do Tricolor, voltou ao Brasil, para surpresa dos inimigos que urubuzavam a negociação. Ah, meus iguais, como eu vibrei quando vi Oscar vestir a nossa camisa! Oscar chegou exatamente quando iria se iniciar o returno do Campeonato Paulista de 1980. Houve furor na Capital Paulista. Ele foi recebido em triunfo no aeroporto de Congonhas, a torcida o carregou, o “Fantástico” fêz matéria especial, o São Paulo FC, favorito para o titulo paulista, virou barbada nas apostas. Lembro-me de que foi marcado um amistoso contra o Palmeiras na quarta-feira seguinte, no Morumbi, para a apresentação de Oscar, “o belo”. Então eu, exultante, proclamei aos amigos e inimigos futebolísticos que aquela quarta-feira do amistoso seria a marcante noite da “Entrega do Oscar”! Apostei, fui ao amistoso, o São Paulo deu um verdadeiro show, goleou o Palmeiras por legendários 4 x 0 , ganhei as apostas e caí de glórias, assim como toda a torcida do Bem-Amado. No domingo seguinte começava o 2º Turno do Paulista. Nosso adversário? O Corinthians. Sim, seria em um “Majestoso” que Oscar faria oficialmente a sua estréia.

O São Paulo vinha de péssimo retrospecto contra o terrível inimigo, os corintianos nos desacatavam, os palmeirenses, humilhados pela goleada que haviam levado na estréia do nosso ídolo entenderam que estávamos muito arrogantes; uniram-se aos alvinegros e então eu fiz mais e mais apostas, eu estava inebriado com a chegada de Oscar. Foi um “Majestoso” memorável, iguais. Em um Morumbi lotado o São Paulo deu um antológico show no clássico e repetiu a dose do anterior “Choque-Rei”, estabelecendo implacáveis 4 x 0 também no Corinthians! Oscar, com a tarja de capitão tricolor, engoliu o ataque do terrível adversário. Pelo alto e por baixo ele foi o soberano absoluto da nossa defesa, deu gosto vê-lo com sua raça, com sua técnica, com sua precisão. Numa dividida na meia-lua de nossa defesa o centro-avante do Corinthians, (quem seria?) atingiu a canela de Oscar, o capitão do Soberano levou mais de 12 pontos na perna no intervalo do jogo e mesmo assim continuou em campo, contrariando ordens médicas.

Estava selada a sorte dos que duvidavam do São Paulo, com Oscar lá atrás jamais perderíamos! E foram tempos inolvidáveis. O Campeonato Paulista tão sonhado terminou com duas célebres vitórias sobre o Santos pelo mesmo placar, 1 x 0; eu estava entre aquelas mais de 120.000 pessoas que viram extasiadas cada um dos jogos. Poucos sabem, foi no Campeonato Paulista de 1980 que Carlos Alberto Silva, nosso técnico, recuou Darío Pereira para a posição de quarto-zagueiro; Don Darío Pereira, que era meia e cuja sorte estava incerta no clube, viria a formar com Oscar a maior dupla de zagueiros da história do São Paulo e do futebol mundial. Falarei particularmente de Don Darío Pereira em outra oportunidade. Por enquanto lhes garanto que, juntos, Oscar e Darío Pereira foram perfeitos. O que Pelé e Coutinho fizeram no ataque, Oscar e Darío fizeram na defesa! O São Paulo tinha Waldir Perez, Getúlio, Oscar, Darío Pereira e Aírton, Almir e Heriberto, Paulo Cesar, Renato, Serginho e Zé Sérgio. Maravilhoso!

Mas o time de 1981 seria melhor ainda. Acho que esse time de 1981 está entre os melhores times da história do São Paulo FC. Nunes Galvão, o impecável, continuou prestigiando a sua diretoria de futebol, os jovens “almofadinhas”, inteligentes, perspicazes e ousados em um tempo em que o futebol ainda engatinhava em termos de marketing, continuaram a busca, não desistiram, queriam mais, queriam transformar o São Paulo num time imbatível, custasse o que custasse. Veio Éverton, um meia atrevido, ofensivo, um achado no Paraná que faria belíssima figura (lembram-se do gol de Éverton contra o Botafogo?) e veio Marinho Chagas, o gênio, contratado também depois de muita novela dos EUA, Marinho era um sonho antigo, Marinho era o maior lateral do mundo! E veio também Mário Sérgio, outro “ifrit”, como dizem os árabes para definir os gênios, um monstro, um jogador extraordinário, quem viu Mário Sérgio nada mais precisa ver para admirar o futebol desejado e celebrado em sonhos.

E o São Paulo ficou praticamente imbatível. Ganhar do São Paulo era missão para Hércules, (caso estivesse em grande forma), o São Paulo arrebentou no Campeonato Paulista, arrebatou o Bi com facilidade, eu estava no Morumbi no jogo decisivol; liderados por Oscar, ganhamos da Ponte Preta na partida final, 2 x 0, sob chuva e com show. Depois de ganhar todos os clássicos que disputara, contra o Palmeiras, no “Choque-Rei” do 2º turno daquele glorioso ano, o São Paulo fez lendários 6 x 2. Foi também um jogo disputado sob intensa chuva, foi uma aula inesquecível de bola, uma antológica exibição que anunciava o título, sob a batuta de Oscar, nosso condutor. O São Paulo era o time da moda, o que se esperava era ver o São Paulo vencer tudo dalí em diante. Em 1981 ocorreu com o São Paulo uma das mais fatalistas jornadas de sua história. A derrota para o Grêmio, no Morumbi, por 1 gol a 0 na decisão do Campeonato Brasileiro daquele ano, foi uma das maiores injustiças engendradas pelo destino futebolístico. O São Paulo era melhor, muito melhor! Por ser melhor durante todo o campeonato, o São Paulo decidia em casa, num Morumbi apinhado, num Morumbi enlouquecido, mas perdeu por 1 x 0. Coisas da bola.

Não vi, de 1981 para cá, quando junto estas letras, outro São Paulo mais precioso tecnicamente, confesso. Nada, porém, abalou nosso personagem, craque acima de qualquer suspeita, Oscar seguiu brilhando. Oscar era a referência do mundo tricolor. Dentro do campo, perfeito. Fora do campo, sempre correto, digno, educado, articulado, líder, disciplinado, um exemplo. Em 1982, ele, Oscar, talvez tenha sido o melhor jogador brasileiro naquela seleção, seleção que muitos consideram a melhor de todos os tempos. Era uma seleção atrevida que não queria se proteger, só queria jogar prá frente, só queria dar espetáculo; Oscar estava lá atrás, era nosso baluarte, mas como defender o time todo sozinho? O time ia, ia, ia, e deixava lá atrás tudo aberto... Como jogou Oscar aquela copa, meu Deus! A raça de Oscar encantou o mundo, ele defendia, gritava, estimulava os demais, foi algo ímpar ver aquele elegante zagueiro desesperado, tentando comandar um time que parecia jogar com 200 atacantes no dia da desclassificação, contra a Itália, naquele fatídico 3 x 2! Oscar sofreu naquela copa e naquele jogo, principalmente. Pobres de espírito os que pensam que o time era perfeito, Oscar ficou órfão e sozinho na defesa e deu no que deu. Lembram-se da cabeçada de Oscar que o goleiro italiano defendeu milagrosamente nos momentos finais, iguais? Se aquela bola entra... Oscar foi um zagueiro que beirou a perfeição.

Oscar era sério, com ele não havia brincadeira. Fora ou dentro das quatro linhas. Oscar capitaneou o São Paulo por longos 7 anos; quando os “Menudos”, liderados por Muller, surgiram, em 1985, foi ele, Oscar, quem os comandou, Oscar era a referência tricolor, era o paradigma, era um chefe inolvidável, idolatrado pelos são-paulinos, intensamente admirado pelos adversários. Quando seu ciclo terminou no São Paulo, Oscar foi mostrar sua arte no Japão, até hoje o nome de Oscar é reverenciado entre os japoneses, o “belo” fulgura no panteão do futebol oriental como um astro para sempre. Muitas e muitas vezes estive ao lado desse deus da bola. Participamos juntos de programas de TV, nos encontramos em várias ocasiões. Todas as vezes em que tenho o privilégio de estar ao lado dele relembro-lhe glórias são-paulinas. Ele é são-paulino, não esconde, relembra comigo, nossos olhos lacrimejam! Na última vez em que, por mercê de Deus, juntos estivemos, contei-lhe longa história sobre um sofrido “Majestoso”; narrei-lhe o gol que assombrou o Pacaembu e que nos deu a vitória, no derradeiro minuto. Disse-lhe: “que cabeçada sua, Oscar”! E ele teimou: “foi com o pé direito, Catta”... Continuo achando que foi de cabeça. No fim acabamos rindo, quase chorando. Terá sido de cabeça? Terá sido de pé direito aquele gol que deixou louco o Pacaembu?

Oscar já virou lenda, e os feitos de Oscar também já viraram lenda. Jogador eterno, Oscar é um personagem que vai atravessar os tempos em razão de sua singular passagem pelos gramados. Oscar é perene. E eu vi Oscar jogar, graças a Deus.

Ave, Oscar, grande capitão, vida longa a você!

Paz, meus iguais.

Antonio Carlos Sandoval Catta-Preta é advogado e são-paulino.

Texto retirado do blog do Marcello Lima

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