De lá para cá, muita água rolou por baixo desta ponte.
O futebol brasileiro seguiu em seu deserto de ideias, e Diniz era visto por muitos como um salvador — um rótulo, convenhamos, tão indesejado como desproporcional. Por outros tantos, porém, passou a ser encarado como uma espécie de encantador de serpentes, quase um estelionatário do "jogo bonito", incapaz de fazer seus times aliarem bola a resultado — outro rótulo absurdo.
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Fernando Diniz teve chances no Athletico e no Fluminense. Não deu certo. E, quando foi contratado pelo São Paulo, seis meses atrás, ninguém mais apostava tudo nele. As comparações com Guardiola — que já pareciam descabidas — também estavam esquecidas.
Comparações que, para ele, nunca fizeram tanto sentido assim, como ele contou em uma conversa exclusiva de duas horas com o UOL Esporte. A pergunta era simples: "Guardiola é uma inspiração?". Uma pergunta quase protocolar, que possivelmente viria seguida uma resposta também óbvia. Ledo engano.
Eu acho que na minha relação com os jogadores eu devo ser mais parecido com o Diego Simeone. A coisa de entrar neles, tentar extrair o máximo, uma relação muito forte entre as partes".
Não deixa de ser espantoso pensar que Fernando Diniz, questionado sobre Guardiola, responde com Simeone. Polos praticamente opostos do futebol europeu. Um, o catalão, visto como uma inspiração, um estilista, o herói do resgate do jogo bem jogado, quase que um enviado dos céus. O outro, o argentino, a imagem do futebol aguerrido, competitivo, de resultados, com absolutamente nenhuma preocupação com a estética.
Diniz nunca se autoproclamou o Guardiola brasileiro. Ele apenas gosta que seus times joguem bola, o que deveria ser básico e poderia estar acontecendo por aqui há mais de dez anos.
"O meu jogo em si tem muita inspiração no Guardiola, no sentido de querer impor o jogo, dominar, se divertir, acho que entendemos o futebol de maneira parecida, possivelmente. Mas é curioso: quando vi jogos dos times dele no estádio, ao vivo, fica muito claro que o modo de executar é muito diferente", explica Diniz.
"O time dele é absolutamente posicional, é um jogo em que jogadores guardam as posições nas faixas de campo que ocupam. E o jogo chega até eles. As exceções são o centroavante, no caso o Aguero, e o primeiro homem, o Fernandinho. Meu time de hoje, por exemplo, é totalmente diferente. A gente tem muita troca de posições, guarda pouca posição no meio e na frente, tenta aplicar um jogo dinâmico, é uma participação coletiva diferente."
Seria esse então o "Dinizmo", a versão tupiniquim do "Guardiolismo"?
"Cara, eu nem sei o que é o Dinizmo. Meus filhos me falaram que saiu uma reportagem com esse termo, eles acharam legal. Mas não sei nada disso, não", fala, mais encabulado do que orgulhoso quando deparado com a pergunta.
O papo com Diniz mostra claramente que ele não é um técnico viciado em táticas ou estratégias. Nada é estático. O pilar principal do trabalho do treinador do São Paulo é seu relacionamento com os jogadores.
Sim, ele gosta do jogo bem jogado, isso é inegociável. Ele acredita que o futebol precisa ser algo prazeroso para quem joga e para quem vê. A estética importa. A utopia importa. As convicções importam. Mas não há uma amarra tática, uma receita única para traçar esse caminho.
Os times de Diniz são não apenas o que ele quer que sejam. São o que ele é, somado ao que ele tem. E todo o processo depende de uma construção coletiva, em que os jogadores são levados a comprar essa ideia — a ideia de que o futebol bem jogado te deixa mais perto da glória completa. Não só uma vitória, mas uma vitória inesquecível.
Eu não queria que parasse o futebol de jeito nenhum. O gráfico do São Paulo é de crescimento. A gente já vinha jogando bem e, agora, estavam vindo também os resultados. Era um momento, para o São Paulo, que não era dos melhores para parar. Mas não tinha jeito. Vamos esperar que, quando voltar, a gente tenha uma queda menos acentuada do que os outros
Fernando Diniz
Eu queria que você falasse um pouco da tua relação com os jogadores. Você é formado em psicologia. Usa isso diariamente?
Conseguir aprofundar a relação com eles é um dos pilares do meu trabalho. Não atribuo um peso grande ao fato de eu ter feito psicologia. Nada. Nem penso (em usar técnicas). Já devo ter usado em alguma dinâmica, mas não planejo. Já o fato de ter feito e fazer terapia me ajuda. Conhecer a si próprio te facilita para conhecer o outro. Mas o mais importante disso é gostar dos jogadores. Saber ouvir, ter empatia. E para mim é fácil ter, porque eu fui um deles e ter sido jogador é um pedaço que vai morrer comigo, ser oriundo do mesmo berço social. Embora o mundo esteja mudando muito, isso facilita. As coisas importantes da vida nunca vão mudar. Ser compreendido, ter espaço para falar, ter cicatrizes emocionais que precisam ser vistas. As pessoas precisam de carinho, de afeto, direcionamento. Nada substitui o contato humano. Abraçar, se comunicar, ver a expressão facial. A energia que troca é muito diferente.
Você consegue criar a situação de os caras jogarem por você? No Fluminense, dava para ver como eles sentiam demais os gols perdidos, meio que sabendo que sobraria para você.
Eles não jogam por mim, mas jogam por uma ideia construída solidariamente. Meus maiores professores sempre deram muita liberdade, e isso é diferente do que eles (os jogadores) estão acostumados. Esse processo é muito fácil pra mim, não sei fazer diferente. Eu quero ver meu time jogar bem e viver bem, quero vê-los felizes. Tento promover um ambiente em que a gente consiga construir as coisas de forma coletiva, todo mundo dá opinião. Então eles sentem que fazem parte disso, é muito vivo, muito orgânico. Os times que eu dirigi têm muita coisa parecida entre eles, mas muita coisa diferente também. Um cara fala, outro fala, passo o dia inteiro pensando nos jogadores, e no time e eles têm uma liberdade muito grande, tanto no plano tático quanto nas relações pessoais. A gente molda em função do que temos à disposição e do que eles mesmos propõem. Como o jogo que eu proponho é mais criativo, não de repetir padrão, a gente olha muito para dentro e tenta fazer que eles se sintam mais criativos. Tudo isso dá o sentimento de pertencimento à causa e é assim que eles jogam, para isso tudo dar certo para todos nós, não para o treinador.
No São Paulo, a bola começou a entrar. Você vê hoje teu trabalho ser mais reconhecido?
Publicamente, sim. É difícil para as pessoas avaliar o que está sendo feito, quase todas comentam tentando achar argumentos que possam justificar resultados das partidas, e não o contrário. Tem que olhar o que está sendo feito dentro do campo. Eu sugiro um exercício: assistir a um jogo sem ver os gols. Não saber como é que foi o resultado e aí fazer a análise em cima do que viu. Falta muita racionalidade no futebol, as pessoas são muito envolvidas pelo resultado. Ganhou, está tudo certo, e se perdeu fica um óbvio que está ruim. Entra todo mundo em uma vala comum. No Fluminense aconteceram coisas inexplicáveis, mas de repente aconteceu tudo aquilo, aqueles jogos que deveríamos ter vencido e não vencemos, e hoje estou no São Paulo. As coisas sempre confluem para o bem, com quem trabalha com essa direção. Acho, que no futebol, a gente sabe pouco. Mas tem gente que vem com solução muito fácil.
É o tal resultadismo...
Às vezes o trabalho tem resultado, mas não é bom. Eu sou muito focado naquilo que consigo fazer. O melhor momento da minha vida é dando treino, é quando consigo melhorar as pessoas, fazer com que as coisas fluam. O resultado de um jogo às vezes não corresponde ao bom trabalho que está sendo feito. Mas, quanto melhor trabalha, mais perto está do resultado. Eu não fico me desgastando tanto com as críticas. Tem comentários muito simplistas e tento não perder tempo. E tem gente boa, o cara fala alguma coisa que não é básico do básico, eu vejo se tem sentido. Não sou impermeável ao resultado, ele me deixa mais contente e mais triste. Mas não pode ser determinante para falar que um trabalho é bom ou ruim, o resultado não pode te aprisionar. As pessoas ficam muito presas a isso, vira o único argumento, e isso te inibe de pensar.
Para muitos, a única explicação para os times do Diniz perderem tantos gols é falta de treino.
Uma que meu time treina finalização, até mais que concorrentes. O mais importante é ter jogador que termina bem a jogada. Na Europa, ninguém mais treina finalização. O cara que é habituado a fazer gol vai e faz o gol. Treino não é o principal, de cara para o gol o componente emocional é muito mais forte. Mas a gente treina bastante, repetir ajuda para caramba. Só não é o elemento principal.
Há quem diga que você é protegido pela imprensa. Há quem diga que você é massacrado pela imprensa. Você se sente como?
Não me sinto nada. Eu procuro entender o que as pessoas falam. O que acho meio ruim é quando a pessoa emite a opinião uma ou duas vezes e aí quer que a opinião se confirme, deixa de ver o que está acontecendo. Há poucos jornalistas com quem eu falo. Eu faço meu trabalho, procuro aprofundar no dia a dia e abstrair o que vem de fora. No futebol, a gente sabe pouco. Por mais que a gente queira saber muita coisa, a gente não sabe muito. São simplesmente variáveis demais.
Por que o Diniz, que nem é um cara polêmico, gera amor e ódio dessa maneira?
Eu acho que é porque eu tenho uma ideia de futebol, faço muito as coisas que acredito e tomo os riscos que acho que devo tomar. É muito difícil fazer o que eu não acredito, na vida também sou assim, e isso pode incomodar. Na sociedade do capital, a noção do sucesso é o cara que tem dinheiro. No futebol, bom é só o que ganha. Mas um time pode ganhar e ser ruim, ter um resultado esporádico. Veja, a ciência muda toda hora, mas a arte fica. Aquilo que a seleção de 82 fez, sem ganhar... tem arte no futebol! Nosso esporte é a subversão da natureza, fazer o que se faz com os pés. Futebol tem muito de arte, de ruptura. Quase a totalidade das pessoas querem se sentir seguras em um mundo que não é seguro. Querem repetição de padrão para ter segurança, são avessos à criatividade e ao risco. Mudar um pouco o curso das coisas cria uma insegurança.
As chegadas de Jesus e Sampaoli te ajudaram? De alguma forma, você deixou de ser visto como o único técnico que propõe bom futebol. Acha que esse movimento de busca pelo bom futebol é duradouro ou é moda em função dos resultados em 2019?
É mais a moda. Se o Simeone vier aqui, passar e ganhar do jeito dele, muda a moda. Jesus e Sampaoli ajudaram não a mim, mas ao futebol brasileiro. Eles são bons para caramba. O trabalho do Sampaoli, como teve ausência de título, em algum ponto foi subvalorizado. Era um time que jogava muito bem, tomava mais risco, com menos recurso. Muito, muito forte. O Santos era um time impositivo. E o Flamengo bateu tudo quanto é recorde, ficou marcado na história. Foi bom para o futebol brasileiro. Mas não quer dizer que não tenha bons treinadores aqui. Tite lá fora também faria um bom trabalho.
"A imagem do Pato nunca me enganou"
No São Paulo de 2019, Fernando Diniz não tinha tempo. Estreou após apenas um treino em pleno Maracanã e conseguiu sair com um 0 a 0 contra o Flamengo. O bom desempenho em casa — 75% de aproveitamento, contra 37% fora — permitiu ao São Paulo ir diretamente para a fase de grupos da Libertadores e garantir a sequência do técnico.
Em 2020, a história é outra. Se no ano passado ele não tinha literalmente tempo para, por exemplo, dar a Alexandre Pato a atenção necessária, agora ele não só tem tempo para isso, como teve também uma pré-temporada de trabalho com praticamente o mesmo elenco. Se o São Paulo irá brigar pelos títulos grandes (Libertadores, Brasileiro e Copa do Brasil), só o tempo dirá. Mas o treinador enxerga a conquista de títulos como o único objetivo plausível em um clube deste porte.
De quanto tempo um técnico precisa para colocar sua digital em uma equipe?
Varia muito de treinador. Quando tem solidificado dentro dele o que ele quer, é mais rápido. Jesus levou mais tempo que o Sampaoli. Varia muito até estabelecer laços de confiança, [depende] o tipo de jogador que você tem. A confiança vai vindo, às vezes o cara acerta no treino, depois erra. Tenta no jogo, acerta. Ganha confiança, tenta de novo. O Bruno Alves, por exemplo, nunca tinha sido requisitado a sair passando a bola. Hoje é um cara que já tem confiança para sair para o jogo, passar por um, dois, três caras. Amplia o jogo dele, que já era espetacular defensivamente.
O lado dele ali sofre um pouquinho, às vezes fica sobrecarregado. Teu lado esquerdo defensivo te preocupa?
O meu time tem uma característica de ser penso para o lado direito. Daniel Alves, como todos sabem, o Tchê Tchê também já jogou até de lateral direito, o Igor Gomes também tende a jogar mais por ali. Isso gera, defensivamente, uma sobrecarga do lado esquerdo, ali para o Reinaldo e para o Vítor Bueno, que nunca precisou fazer essa recomposição e está ainda aprendendo. Os outros times percebem isso, é algo que estamos ajustando e que os próprios jogadores estão percebendo, então com o tempo vai melhorar.
Teus times costumam gerar muitas chances e ceder muitas chances. Você concorda com esta análise?
Esse time do São Paulo já era sólido quando postado defensivamente antes da minha chegada. Mas quando um time está muito dentro do campo do adversário, uma hora ou outra vai estar exposto. Não é cobertor curto, é opção. Você está o tempo todo no ataque, o outro time que se fecha bem... Vacilou, furou primeira linha da transição, a jogada vai terminar no seu gol. Logo a análise é que o ponto fraco do time é a transição defensiva. O que fica para o resultado é que você tomou o contra-ataque. Mas se você treina mais o ataque, que é a tua característica, cria 20, 30 chances de gol e depois cede dois, três contra-ataques, como dizer que você cede muitas chances? Você cria muito, muito mais do que cede. Contra a LDU, nosso melhor jogo, não cedemos uma chance sequer de gol.
Depois desta vitória contra a LDU, o Pato te elogiou demais na coletiva. Você estava do lado dele. Ele já tinha falado tudo aquilo para você pessoalmente, antes de falar publicamente?
Tenho uma relação com o Pato que é o seguinte. Ele nunca conseguiu me enganar daquilo que ele é. Ele não é aquele cara que aparentemente era, que as pessoas falavam, a imagem de pouco competitivo, indolente, desinteressado. Pra mim ele nunca foi isso, nunca me enganou. Eu só queria me dedicar a poder ajudá-lo a botar para fora aquilo que ele é. E acho que ele está conseguindo. Ele precisava de alguém estar perto para ajudar um pouco para ele se encontrar. Considero o Pato um dos jogadores mais talentosos do mundo, ele faz coisas difíceis parecerem fáceis. Hoje, ele conseguiu se estabelecer no nosso time e de maneira estável, jogando consistentemente. O nível de atuação dele é muito bom, dá sinais claros de ajudar o time, de que tem o interesse em ajudar o outro e produzir coisas próprias do talento que tem.
Como reagiram Hernanes e Pato à reserva no ano passado? E agora Hernanes novamente...
Ano passado, a reação coletiva foi boa, os dois continuaram ajudando. O Hernanes veio da China, apressaram para ele poder estar no campo, teve uma série de contusões que o prejudicaram. Tem uma identificação grande com o clube, é um cara de grande caráter, muito íntegro, profissional. Não deu um trabalho com nada, pelo contrário. Só ajudou, sempre positivamente mesmo sem estar entrando. Ele tem condição de virar titular de novo, está cada vez mais à vontade com o corpo dele. O Pato não me deu trabalho nenhum. No ano passado, eu não tinha tempo, era arriscado. Eu precisava parar para ver onde conseguiria ajudá-lo como ser humano e naquele momento era melhor seguir com quem estava produzindo mais. Neste ano, estou conseguindo ajudá-lo e ele está dando um retorno incrível.
Ofensivamente, tudo parece passar pelo Daniel Alves.
É um jogador enorme, fundamental para mim e para o time. É um cara que ajuda demais todo mundo, é muito inteligente, realmente agrega. Me ajuda, traz uma bagagem incrível, e sempre tem uma palavra positiva para todos. Olha para todo mundo no grupo, fala muito com os meninos, ele é realmente muito grande. E, como jogador, vai falar o que de um cara desses? Ele joga muita bola. Ele pode fazer o que ele quiser dentro de um jogo, tem muito talento, é muito acima da média.
Para mim ele nunca foi lateral direito. No Barcelona, sempre foi um atacante, sócio do Messi, do Xavi, talvez por isso na seleção nunca tenha se destacado tanto. Parece que nesta função no meio de campo vocês encontraram a posição ideal para ele. É um camisa 8, que pode ser um camisa qualquer coisa ao longo do jogo. Lembra muito o próprio Xavi.
Vejo da mesma maneira que você. Foi uma construção conjunta, ano passado foi importante para observar algumas coisas, na pré-temporada falamos muito e a coisa foi refinando para chegar onde estamos. É isso, é um 8 e lembra, sim, o Xavi. Nosso jogo começa por ele, é o condutor entre todas as linhas e pode aparecer em qualquer lugar do campo. Pela direita, onde domina tanto o espaço, faz jogo pelo meio, é armador, chega na área, faz gol, é realmente muito completo.
Onde esse São Paulo pode chegar? Pode encarar o Flamengo?
Pode chegar longe em todos os campeonatos, o trabalho é todo nesse sentido, ir avançando em todas as competições. Eu não trabalho olhando para Flamengo, Grêmio, Palmeiras. Trabalho para deixar nosso time em condições de chegar a qualquer tipo de resultado positivo. Não pode pensar em outra coisa, o mínimo é tentar ganhar os campeonatos todos. O pensamento só pode ser esse. Tem que acreditar que isso é possível.
O quão conturbado é o ambiente do clube?
Por dentro, é muito melhor do que a imagem que se pode ter quando se está de fora. Existe boa harmonia, diretoria, presidente, funcionários, todos caminhando juntos. A sensação é muito boa. Essa pressão pela ausência de títulos só vai sair quando ganhar. A gente tem que filtrar isso para abastecer de maneira positiva internamente. Lá dentro tem muito mais coisas positivas do que negativas.
Muitos fazem paralelos entre você e o Tiago Nunes, por ele ter te substituído e sido campeão no Athletico. Agora a situação está invertida, você está por cima e ele por baixo. Como você vê o Tiago no Corinthians?
Lá no atlético, eu fiz o que eu podia. E também fiz tudo o que podia para ajudá-lo. Na minha saída, disse ao (Mário Celso) Petraglia que era uma boa ficar com ele no comando. Deu certo. No Corinthians, foi muito pouco tempo para avaliar. É muito cedo. Ele precisa de tempo para poder trabalhar. Ninguém só ganha, ninguém só perde, mas vai precisar de tempo para reverter. No fundo a gente sabe que o tempo é uma coisa muito delicada no futebol, então vamos ver se ele terá esse tempo. As pessoas podem nos comparar, mas não faço comparação nenhuma.
"Tinha que cancelar mesmo. Tem coisas mais urgentes"
A paralisação do futebol mundial, não só paulista, veio no momento em que o São Paulo acabara de ganhar muito bem da LDU, pela Libertadores, e um clássico contra o Santos, de virada. "Olha como são as coisas. Se tivesse parado uma semana antes, após aquelas duas derrotas (Binacional-PER e Botafogo-SP), a avaliação do meu trabalho seria outra e teria toda aquela conversa", avalia Diniz.
O fato é que não parou uma semana antes. Mas parou justo quando o time havia engatado a terceira marcha. Uma pausa inevitável, diante da pandemia do coronavírus, mas que veio em péssima hora para o São Paulo.
Vocês estão com medo?
Tem medo no ar. Preocupação. De como as coisas vão ser, quando vai voltar. No São Paulo não tem pânico, mas tem medo. Aqui no Brasil ainda não pegou um jogador, quando vai chegando perto do teu meio, assusta mais.
Como você vê o que está acontecendo?
Se as pessoas aprenderem alguma coisa com isso, vai valer a pena de alguma forma. É uma chance de as pessoas refletirem, verem que não adianta viver só para si, que precisam se ajudar um pouco mais. Mas quando atingir as camadas mais pobres... é muito preocupante.
E a decisão de adiar torneios todos? Agora está mais fácil perceber que era a decisão certa, mas como você avalia o processo todo?
Não tem como não fazer. As coisas foram muito rápidas. Tinha que cancelar mesmo, tem coisas mais urgentes para a gente pensar. Todo mundo tem que colaborar, todos os setores da sociedade vão ter impactos muito fortes. A gente tem que tentar se ajudar para não deixar alastrar, ficar em casa conseguir controlar, e todo mundo se ajudar.
Renato Gaúcho chegou a falar até em greve no fim de semana passado. Do jogo da LDU para o jogo do Santos, houve um movimento muito forte de aumento de casos e mortes no mundo. Vocês estavam pensando em de repente não jogar?
A gente conversou disso. Para mim, estava muito claro que ia ter aquele jogo contra o Santos e mais nada. O não dito estava quase dito. Era uma coisa de um, dois dias. Se não parasse, ia haver um movimento forte de todo mundo, e eu ia participar, para não continuar.
E a experiência de jogar com portões fechados? É bem capaz que isso se repita muito quando o futebol voltar.
Não tem nada a ver jogar sem torcida. O futebol que a gente pratica tem um pedaço de espetáculo. O jogo dos grandes clubes é para poder alegrar o torcedor, é o torcedor que faz as coisas acontecerem, ele que paga todas as contas. Não tem sentido o futebol sem o torcedor. E para quem está lá, perde o brilho, perde o encantamento. A falta de torcida no estádio deixa o futebol mais pobre.
Seria melhor então esperar para voltar quando a torcida puder ir aos estádios?
De uma maneira idealizada, seria melhor esperar para voltar direito. Mas às vezes a situação dos sonhos não é possível. Não vai ter data, vai espremer calendário, comprometer, etc... E pode ser que alguns jogos sejam com portões fechados. Paciência.
O São Paulo foi o maior prejudicado do futebol brasileiro pela parada?
Eu não queria que parasse de jeito nenhum. O gráfico do São Paulo é de crescimento. É todo um processo. Ano passado foi muito importante para o time, tivemos o amadurecimento emocional das pessoas que estavam envolvidas. O time foi mostrando que tinha força e criou uma base para o que ia acontecer esse ano. Nós aproveitamos muito bem a pré-temporada, logo no primeiro jogo tivemos mudanças muito claras. Tinha um alívio pela vaga na Libertadores, teve a manutenção do meu trabalho, muito treino. Optei na parte tática por deixar muito redonda a saída de bola, repetimos muito os treinos e depois fomos ajustando as outras partes do time. O time tinha mais segurança para jogar, os movimentos necessários. E agora quando parou a gente já estava jogando bem e pouco a pouco vieram os resultados. O jogo mais emblemático foi o da LDU, a melhor partida do time, do começo ao fim, jogando de maneiras diferentes. Começou agressivo, depois soube se defender, conseguiu resultado importante e com o time muito coeso, fazendo as coisas de maneira positiva. Se defendeu bem, articulou bem a saída com o Volpi, os movimentos de ataque e a conexão com o torcedor. O torcedor que talvez tenha mais carinho pela Libertadores é o são-paulino, aquela noite foi um banho de positividade para o torcedor. Aí veio o do Santos, não teve a mesma intensidade, mas ganhou o clássico, jogou bem. Era um momento que para o São Paulo não era dos melhores para parar. Esperar que, quando voltar, a gente tenha uma queda menos acentuada do que outros.
O que você planeja fazer? Algo a fazer à distância com os jogadores?
Ainda não sei muito o que fazer. A gente precisa muito da prática, meu trabalho exige muito o campo e estar perto para trocar ideias e se relacionar com mais profundidade. Os pilares do meu trabalho ficam muito comprometidos com essa situação. À distância, juntar as pessoas... é praticamente impossível de fazer. Muito difícil conseguir no sentido tático, coletivo, relacional, fazer coisas que vão gerar melhoria no time. Vamos procurar conversar quando der. Estou tentando na minha cabeça elaborar alguma coisa que seja boa para o time no sentido tático, mas não é fácil. Porque basicamente meu trabalho é treino e muita conversa. Mas a conversa sem o treino, sem o vídeo do jogo para ir fazendo as correções, não fica muito bem fundamentada. É uma situação muito sui generis, vamos ver como se desenrola.
São Paulo, Entrevista, Diniz, SPFC
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