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Vandalismo, assédio, confusão: o que fazem torcedores afastados dos estádios pela Justiça em SP

Infratores se apresentam em instituições públicas no horário de jogos, mas falta de fiscalização compromete cumprimento das penas

Foto: Marcos Ribolli

Proibidos de ir a estádios de futebol pela Justiça de São Paulo, torcedores estão causando problemas nos locais onde cumprem as punições que foram impostas pelo tribunal. Os relatos incluem desde o consumo de bebidas alcoólicas a vandalismo, assédio de funcionárias e constrangimento de vítimas de abuso sexual.

Com fiscalização falha e estrutura insuficiente para esse papel, as instituições que recebem os torcedores reclamam em comunicações feitas à Central de Penas e Medidas Alternativas (CPMA) da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP) do Estado, órgão responsável pela execução das penas.

Quatro entidades públicas recebem os torcedores afastados em São Paulo: o Instituto Médico Legal (IML), o Hospital Lucy Montoro, o Corpo de Bombeiros e a Escola de Sargentos da Polícia Militar. Os infratores devem se apresentar até uma hora antes dos jogos de seus times e só podem deixar os locais após as partidas.

As instituições assinaram convênios com a Secretaria de Segurança Pública (SSP) paulista, idealizadora e principal fiadora do projeto criado em 2016 para combater a violência no esporte. O pacote, que dava mais poder ao Juizado do Torcedor, também incluiu a realização de clássicos com torcida única em São Paulo.

As principais queixas são dos responsáveis pelo IML. O GloboEsporte.com teve acesso ao relatório de uma reunião realizada entre membros da CPMA e do IML em junho – o documento foi enviado ao Secretário de Segurança Pública de São Paulo, Mágino Alves Barbosa Filho.

Na conversa, o chefe-geral do IML Central cita desordem, afirma que o efetivo do instituto (um ou dois funcionários nos horários que os torcedores se apresentam) é incapaz de "controlar" os infratores que, por vezes, falsificam os registros de frequência.

Há observações ainda mais graves: vítimas de abuso e familiares são constrangidos ao se apresentarem no IML para exames, e quando há uma mulher entre os plantonistas que recebem os torcedores, "na maioria das vezes", ela é assediada.

Insegurança

Funcionários do Hospital Lucy Montoro, uma rede de reabilitação ligada à Secretaria dos Direitos da Pessoa com Deficiência, também relatam insegurança ao receber os torcedores punidos.

Em e-mail enviado à CPMA em maio, que consta em processo contra onze torcedores do São Paulo acusados de vandalizar estações de trem e de agressão a rivais em 2015, uma colaboradora do hospital cita que em 29 de abril a unidade do Morumbi recebeu 11 torcedores. Eles danificaram uma mesa de jogos usada pelos pacientes.

Na mensagem, a funcionária afirmou que o hospital, no horário em que os torcedores se apresentam, tinha apenas três guardas, sendo que eles "devem circular para garantir a segurança dos pacientes".

– Não temos como acolher essa quantidade de apenados – escreveu a colaboradora.

Por causa deste episódio, a Justiça determinou que esses torcedores fossem realocados para cumprir as penas na Escola de Sargentos. A comunicação à Polícia Militar foi feita numa quarta-feira, horas antes de um jogo do São Paulo. A polícia aceitou "em virtude da urgência e necessidade".

O diretor-administrativo da unidade do Morumbi da Rede Lucy Montoro, Fábio Pacheco, classificou o incidente como um "caso isolado". Atualmente, dois torcedores cumprem pena no local.

– Neste dia foi designado um volume de pessoas muito maior do que estávamos esperando. Esse volume não temos condições de comportar – disse.

Pacheco contou que os torcedores colaboram com a limpeza do hospital e em pequenos reparos. Ele também afirmou que não tem intenção de desfazer o acordo com a SSP.

– Essas políticas têm que dar oportunidades, grande partes deles são jovens. Respeitando os critérios para essa parceria, não vemos problemas em continuar. Mas não podemos expor a instituição a um risco desnecessário.

Nas mensagens a que a reportagem teve acesso, uma funcionária do CPMA diz que "representantes do Lucy Montoro me ligam diariamente para saber se foi desfeita a parceria". Segundo essa mesma colaboradora, a preocupação se estende às outras três instituições: "todas", escreve ela, "sentem-se inseguras".

A insegurança também incomoda os próprios infratores.

Recentemente, um torcedor são-paulino que cumpria medida no Hospital Lucy Montoro foi transferido para o Corpo de Bombeiros por mau comportamento.

No novo local, porém, dividiu espaço com membros da Torcida Independente, com quem mantém "inimizades", como apontou um defensor público. Foi, então, enviado para a Escola de Sargentos – onde também se apresentam integrantes da maior organizada tricolor.

Ele se negou a comparecer no dia 19 de agosto, dia em que o São Paulo enfrentou a Chapecoense pelo Brasileiro, "temendo por sua vida". O torcedor pediu para voltar a cumprir a pena no hospital, mas a Justiça apenas o autorizou a deixar a Escola de Sargentos 30 minutos antes do fim das partidas.

Realidade pior do que a expectativa

Procurada pelo GloboEsporte.com para comentar os relatos de desobediência dos torcedores, a SSP se manifestou através de nota:

– Todos os abusos cometidos durante o cumprimento das medidas alternativas são relatados à Central de Penas e Medidas Alternativas para que providências sejam tomadas – diz o curto comunicado.

Já a SAP, via assessoria de imprensa, informou que as perguntas deveriam ser encaminhadas ao Tribunal de Justiça de São Paulo.

Titular do Jecrim (Juizado Especial Criminal) de São Paulo, o juiz Ulisses Pascolati Junior é também o responsável pelo Juizado do Torcedor, um anexo ao primeiro que concentra os processos relativos a crimes previstos no Estatuto do Torcedor.

Ele disse ter conhecimento dos relatos de desobediência por parte dos torcedores que cumprem as medidas de afastamento:

– Chegam comunicações de que há desrespeito por parte de alguns sujeitos que são reticentes em cumprir ordens dos funcionários, principalmente do IML.

Pascolati afirmou que o objetivo das medidas é o de manter os torcedores envolvidos em episódios de violência longe dos estádios – a prisão é uma medida extrema que deve ser aplicada apenas em casos de reincidência.

– Se o juiz impôs a cautelar, e ele descumpriu, a segunda medida é a prisão. A finalidade é afastá-lo. No final, se não houver jeito de afastar o sujeito do estádio, (a solução) é prendê-lo.

Segundo Pascolati, o Juizado do Torcedor já afastou 355 pessoas dos estádios – hoje, 139 estão cumprindo medidas restritivas. Ele admite que a estrutura para investigar, processar e fiscalizar o cumprimento das penas é insuficiente.

– Tinha-se uma ideia de um número determinado de torcedores que poderiam se envolver em fatos criminosos. O problema é que cresceu. Já passaram por aqui mais de mil pessoas. A realidade foi maior do que a expectativa.


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